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Carta do Governo ao Parlamento Nacional sobre as irregularidade cometidas pela Justiça

Xanana usou pareceres de portugueses e americanos para expulsar magistrados de Timor
07/11/2014 - 07:22
O escritório de advogados Arent Fox, que tem um peso-pesado da área do direito do petróleo, está a aconselhar o Governo de Timor nos polémicos litígios com petrolíferas que justificaram a expulsão dos magistrados portugueses.
A avaliação negativa que o primeiro-ministro timorense, Xanana Gusmão, faz do sistema judicial do seu país – e que levou à expulsão de vários magistrados portugueses a trabalhar no território – está sustentada em pareceres de dois professores de Direito da Universidade de Coimbra e da Arent Fox, um influente escritório de advogados norte-americano contratado pelo Governo de Díli.
Numa carta de 11 páginas dirigida no fim de Outubro ao presidente do Parlamento timorense e distribuída pelos 65 deputados, Xanana Gusmão expõe em pormenor o que descreve como “indícios de erros e irregularidades” nos tribunais e aponta, um a um, dez “erros”, ordenando-os de forma explícita: “Erro n.º 1 do Tribunal”, “Erro n.º 2 do Tribunal”… e assim por diante.
O segundo bloco de argumentos é sobre “outras sérias preocupações”, o terceiro aponta os quatro “erros” do Ministério Público e o último aborda o “preconceito do Ministério Público contra o Estado”.
Na carta, o primeiro-ministro cita os nomes dos professores José Casalta Nabais e Suzana Tavares da Silva, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, que caracteriza como especialistas na área do direito do petróleo e do gás e a quem pediu pareceres sobre alguns casos polémicos que envolvem Timor e várias petrolíferas. Os dois professores estão entre os autores de Direito do Petróleo, editado pela Universidade de Coimbra no ano passado.
Segundo o primeiro-ministro timorense, os pareceres dos dois professores portugueses confirmaram duas avaliações anteriores: a do ex-presidente do Tribunal de Recurso, o timorense-português Cláudio Ximenes, que se demitiu em Fevereiro protestando contra o que “estava a acontecer” nos tribunais do país, e a opinião dos seus “advogados externos” norte-americanos. A Arent Fox, com escritórios em Los Angeles, Nova Iorque, São Francisco e Washington, é uma prestigiada firma de advogados que tem entre os seus clientes a cantora pop Taylor Swift e que há dois anos contratou Jack Coleman, um advogado especializado em petróleo e gás. Durante 11 anos, Coleman foi um dos principais advogados do Departamento do Interior norte-americano, nas Administrações de Clinton e de George W. Bush. Em nome dos Estados Unidos, enfrentou em tribunal gigantes petrolíferos como a Chevron, e empresas mais pequenas como a Norton e a Amber Resources. O PÚBLICO sabe que o escritório da Arent Fox contratou advogados portugueses que estão a trabalhar para o Governo timorense.
Texto condena sistema judiciário

Em nenhum lado Xanana Gusmão menciona expressamente os magistrados portugueses. A sua leitura condena o sistema judiciário em geral e em particular os tribunais, o Ministério Público e a Comissão Anti-Corrupção. Quando enviou a carta ao Parlamento, estavam em Timor perto de 30 portugueses a trabalhar na justiça, entre os quais oito juízes, cinco procuradores e sete oficiais de justiça.
Os alegados erros apontados pelo primeiro-ministro são muito diferentes entre si. Uns são puramente jurídicos, argumentando Xanana que os tribunais não aplicaram as leis fiscais certas nas suas deliberações. O Estado timorense corre o risco de perder 300 milhões de euros, 100 milhões dos quais em taxas petrolíferas não pagas ou deduções consideradas ilícitas. Os restantes 200 são referentes às coimas que deveriam ser aplicadas. Xanana Gusmão disse em entrevistas nos últimos dias que, das dezenas de processos em curso, Timor já perdeu 28 milhões de euros. A abrupta decisão de expulsar os magistrados estrangeiros, entre os quais os portugueses, teve por objectivo parar os processos.
Ignorância é outro dos “erros” apontados. Ou porque os tribunais não compreendem a contabilidade e a mecânica da inspecção fiscal, ou porque não conseguem distinguir as funções e competências, por exemplo, da Autoridade Nacional do Petróleo, que, em algumas circunstâncias, não reporta directamente ao Estado (mas à comissão da Área Conjunta de Desenvolvimento Petrolífero do Mar de Timor), e da Direcção Geral das Receitas do Ministério das Finanças, que supervisiona e cobra os impostos do petróleo. Xanana também acusa os tribunais de “falta de profundidade” na análise dos processos e dá o exemplo do litígio entre o Estado timorense e a Minza Oil & Gas, com sede em Jersey, no qual o juiz impediu que o processo fosse a julgamento. Há também queixas sobre lentidão e excesso de burocracia e exemplos de alegada “parcialidade” contra os interesses timorenses e a favor de outra petrolífera, a Conoco Phillips, a ponto de não deixar o Estado defender-se no momento certo.
Em relação ao Ministério Público, Xanana refere como “erros” o caso de contestações iguais, “palavra por palavra”, em copy paste literal, apresentadas em processos em que se discutiam questões diferentes ou, ainda, diversas “irregularidades” processuais, entre as quais a de juntar processos de oito queixosos e sete questões fiscais diferentes. Xanana apontou, ainda, o “preconceito do Ministério Público contra o Estado” timorense. Dá como exemplo os processos judiciais que contestaram o seu direito a nomear advogados privados – a Arent Fox – para defender a posição do Estado junto dos tribunais, fazendo o Estado perder tempo com essa questão para, posteriormente, nos recursos, reconhecer que afinal o primeiro-ministro tinha esse direito.
Xanana Gusmão dedica também um capítulo à falta de actuação da Comissão Anti-Corrupção, na qual trabalhava até agora um antigo oficial português da PSP, que também viu o seu visto de trabalho cancelado seguido de ordem de expulsão. Genericamente, fala em “factos” indiciadores de “eventuais situações de corrupção” que deveriam estar a ser investigados, mas não dá exemplos. Opta, em vez disso, pelo uso de expressões como “negligências grosseiras” e “casos passíveis de serem considerados eticamente reprováveis”.
O primeiro-ministro ignora todos os casos incómodos de corrupção que correram e decorrem ainda em tribunal envolvendo alguns membros do seu Governo e conclui apelando a que seja aberto um “inquérito sobre o que correu mal” na justiça timorense. Propõe “sanear os mais incompetentes” e deixar de contratar juízes e procuradores internacionais.
Dois dias depois, o Parlamento timorense, "invocando motivos de força maior e a necessidade de proteger de forma intransigente o interesse nacional", aprovou uma resolução suspendendo os contratos com 50 funcionários judiciais internacionais.

Jornal PÚBLICO

Comentários

Anónimo disse…
Os magistrados portugueses que estavam colocados em Timor-Leste passaram os últimos dias com receio relativamente à sua segurança. Não tinham dúvidas de que esta estava em causa. Deixaram de circular pelas ruas. Só saíam para ir trabalhar.

A denúncia é feita pelo juiz Eduardo Neves, que trabalhava há dois meses no Tribunal Distrital de Díli em casos relacionados com as petrolíferas e que, na tarde desta segunda-feira, aterrou no Aeroporto do Porto, regressado de Timor-Leste, donde foi expulso juntamente com outros sete magistrados e um polícia.

Eduardo Neves diz que nenhum juiz foi ameaçado directamente, mas descreve um ambiente cada vez mais hostil aos magistrados do qual encontra exemplo no conteúdo “agressivo” de um blogue que diz ser publicado a partir de Timor.

Eduardo Neves trabalhava em processos de natureza cível. “Fiz subir apenas meia dúzia de recursos [em processos perdidos pelo Estado contra petrolíferas] para o Tribunal de Recurso. Não cheguei a julgar processos, mas ia recebê-los”, explica.

Segundo o juiz, o processo mais “problemático” estava a ser julgado em Singapura por um juiz norte-americano no âmbito de acordos judiciais. “Esse é aquele em que Timor perdeu mais dinheiro”, refere. Já os juízes portugueses “não tomaram decisões definitivas. Os casos estão em recurso”, acrescenta.

Anónimo disse…
"A denúncia é feita pelo juiz Eduardo Neves, que trabalhava há dois meses no Tribunal Distrital de Díli em casos relacionados com as petrolíferas"

E no entanto a procuradora Gloria Alves garantia wm publico que nenhum dos visados estavam wnvolvidos com os processos das petrolifetas. Era tudo por causa das investigacoes a membros do governo. As mentiras tem pernas curtas.

Ainda:

"Segundo o juiz, o processo mais “problemático” estava a ser julgado em Singapura por um juiz norte-americano no âmbito de acordos judiciais. “Esse é aquele em que Timor perdeu mais dinheiro”, refere.

Grande mentira!! O processo no tribunal internacional de arbitragem ainda nao, REPITO, ainda nao proferiu qualquer decisao pelo que nao pode ainda haver qualquer perda.
O senhor juiz deve ser vidente ou esta confirmar a tal "parcialidade contra o Estado" de Timor como sao acusados de ser.

E se isso nao fosse o suficiente, diz o Eduardo Neves que esse processo esta a ser julgado por um juiz norte-americano??

Outra mentira. O processo em tribunal de arbitragem esta a ser decidido por um painel de 3 juizes. 1 escolhido por Timor, 1 escolhido pela ConnocoPhillips e um outro nomeado em concordancia por ambas as partes do litigio.

Quando mais estes senhores falam mais nos vamos apercebendo das mentiras que dizem.

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