«A qualidade dos espaços pode evitar a violência nas escolas»
Especialistas de todo o mundo reúnem[-se], a partir de hoje, na Fundação Gulbenkian para discutir a violência escolar. Um fenómeno que está longe de se limitar a Portugal, como explica ao Destak Carlos Neto.
Professor catedrático, além de ter investigado o bullying nos recreios e de pertencer a um projecto internacional de combate à violência na escola, é um dos coordenadores deste congresso.
ISABEL STILWELL editorial@destak.pt
A violência na escola é transversal ao mundo. Qual diria ser o seu denominador comum?
O problema da violência escolar é complexo, multidimensional e afecta os sistemas educativos em todos os países e culturas. Não é um problema novo, mas temos hoje melhores condições para o estudar. Por outro lado, as mudanças ocorridas na família e na comunidade trouxeram novos problemas para dentro da escola, implicando boas práticas e dimensões diferentes de encarar a gestão das instituições e do acto educativo.
Acaba por ser apenas uma continuação da violência na sociedade, nomeadamente nas famílias?
Essa relação é evidente, mas não exclusiva. Muitos outros factores podem explicar o fenómeno, como a degradação do projecto educativo nas escolas, ausência de referências de autoridade, aparecimento de novas tecnologias, processos de socialização, etc. A violência na escola apresenta contornos específicos em função de características sociais e culturais de cada região, de cada escola e dos alunos, docentes e funcionários.
Há escolas que, pela sua organização interna, favorecem a violência escolar? Quais diriam ser os três principais sinais de perigo?
Estou convencido que sim. Apontaria em primeiro lugar as características físicas e arquitetónicas das escolas em relação à qualidade e conforto de espaços formais e informais, em segundo lugar a qualidade do projecto pedagógico de cada escola em paralelo com uma boa supervisão dos alunos e finalmente a existência de projectos de intervenção centrados na diminuição da violência (vítimas e agressores). Existem já por todo o mundo bons projectos anti-violência e anti-bullying no meio escolar.
A relação com a comunidade parece influenciar o grau de violência na escolas. Em Portugal, a comunidade vê a escola como amiga ou inimiga?
Na maior parte dos casos a comunidade não vê a escola nem como amiga, nem como inimiga. Tem uma atitude indiferente. Essa atitude mental tem criado um distanciamento progressivo, que não facilita a resolução dos problemas. A indiferença e ausência de participação da comunidade nos problemas da escola não tem contribuído para o reforço da estrutura identitária da escola.
Que papel pode ter o desporto na prevenção?
Por princípio, a actividade física e o desporto tem um papel fundamental para a criação de dinâmicas muito positivas de prevenção da violência (solidariedade, fair-play, convivência, auto-estima, etc.). A investigação tem demonstrado que a prática da actividade física e desporto, principalmente em crianças e jovens, é uma das formas mais robustas de prevenção da violência escolar.
Concorda que é basicamente um problema de falta de autoridade?
Não tenho a convicção de que seja apenas um problema de falta de autoridade. A confluência de novas realidades sociais e culturais na vida quotidiana da família e da comunidade leva-nos a pensar que este fenómeno deve ser abordado numa perspectiva ecológica e transversal. Múltiplos factores estão a contribuir para este fenómeno e as soluções não podem ser milagrosas. São necessárias políticas públicas.
Há 'directores' que conseguem fazer a diferença?
Com certeza que sim. Depende da competência, de bons projectos de gestão financeira e pedagógica. Da capacidade de desenvolver um clima saudável, que leve os alunos a gostarem de ir e estar na escola para aprenderem com os professores e conviverem com os amigos.
Os pais não são suficientemente responsabilizados pelo mau comportamento dos filhos?
Em muitos casos é verdade. O comportamento parental sobre a actividade escolar dos filhos é muito variável. Penso que deveriam ser repensadas as formas de participação dos pais e principalmente o valor excessivo que se pretende dar ao rendimento escolar (excelência a qualquer preço), em detrimento do prazer de aprender e de aprender a pensar em situações formais e informais.
DESTAK, 23-06-2008
Especialistas de todo o mundo reúnem[-se], a partir de hoje, na Fundação Gulbenkian para discutir a violência escolar. Um fenómeno que está longe de se limitar a Portugal, como explica ao Destak Carlos Neto.
Professor catedrático, além de ter investigado o bullying nos recreios e de pertencer a um projecto internacional de combate à violência na escola, é um dos coordenadores deste congresso.
ISABEL STILWELL editorial@destak.pt
A violência na escola é transversal ao mundo. Qual diria ser o seu denominador comum?
O problema da violência escolar é complexo, multidimensional e afecta os sistemas educativos em todos os países e culturas. Não é um problema novo, mas temos hoje melhores condições para o estudar. Por outro lado, as mudanças ocorridas na família e na comunidade trouxeram novos problemas para dentro da escola, implicando boas práticas e dimensões diferentes de encarar a gestão das instituições e do acto educativo.
Acaba por ser apenas uma continuação da violência na sociedade, nomeadamente nas famílias?
Essa relação é evidente, mas não exclusiva. Muitos outros factores podem explicar o fenómeno, como a degradação do projecto educativo nas escolas, ausência de referências de autoridade, aparecimento de novas tecnologias, processos de socialização, etc. A violência na escola apresenta contornos específicos em função de características sociais e culturais de cada região, de cada escola e dos alunos, docentes e funcionários.
Há escolas que, pela sua organização interna, favorecem a violência escolar? Quais diriam ser os três principais sinais de perigo?
Estou convencido que sim. Apontaria em primeiro lugar as características físicas e arquitetónicas das escolas em relação à qualidade e conforto de espaços formais e informais, em segundo lugar a qualidade do projecto pedagógico de cada escola em paralelo com uma boa supervisão dos alunos e finalmente a existência de projectos de intervenção centrados na diminuição da violência (vítimas e agressores). Existem já por todo o mundo bons projectos anti-violência e anti-bullying no meio escolar.
A relação com a comunidade parece influenciar o grau de violência na escolas. Em Portugal, a comunidade vê a escola como amiga ou inimiga?
Na maior parte dos casos a comunidade não vê a escola nem como amiga, nem como inimiga. Tem uma atitude indiferente. Essa atitude mental tem criado um distanciamento progressivo, que não facilita a resolução dos problemas. A indiferença e ausência de participação da comunidade nos problemas da escola não tem contribuído para o reforço da estrutura identitária da escola.
Que papel pode ter o desporto na prevenção?
Por princípio, a actividade física e o desporto tem um papel fundamental para a criação de dinâmicas muito positivas de prevenção da violência (solidariedade, fair-play, convivência, auto-estima, etc.). A investigação tem demonstrado que a prática da actividade física e desporto, principalmente em crianças e jovens, é uma das formas mais robustas de prevenção da violência escolar.
Concorda que é basicamente um problema de falta de autoridade?
Não tenho a convicção de que seja apenas um problema de falta de autoridade. A confluência de novas realidades sociais e culturais na vida quotidiana da família e da comunidade leva-nos a pensar que este fenómeno deve ser abordado numa perspectiva ecológica e transversal. Múltiplos factores estão a contribuir para este fenómeno e as soluções não podem ser milagrosas. São necessárias políticas públicas.
Há 'directores' que conseguem fazer a diferença?
Com certeza que sim. Depende da competência, de bons projectos de gestão financeira e pedagógica. Da capacidade de desenvolver um clima saudável, que leve os alunos a gostarem de ir e estar na escola para aprenderem com os professores e conviverem com os amigos.
Os pais não são suficientemente responsabilizados pelo mau comportamento dos filhos?
Em muitos casos é verdade. O comportamento parental sobre a actividade escolar dos filhos é muito variável. Penso que deveriam ser repensadas as formas de participação dos pais e principalmente o valor excessivo que se pretende dar ao rendimento escolar (excelência a qualquer preço), em detrimento do prazer de aprender e de aprender a pensar em situações formais e informais.
DESTAK, 23-06-2008
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