Ramos-Horta chegou a Timor-Leste
A realização de eleições antecipadas em Timor-Leste "pode ter vantagens para todas as partes", declarou o Presidente da República timorense, José Ramos-Horta, à agência Lusa e à RTP em Díli.
"Eu sempre disse que não tenho objecções a eleições antecipadas desde que resulte de um consenso do Parlamento, de todos os partidos", afirmou José Ramos-Horta na sua residência em Díli, onde regressou hoje depois de ter estado em tratamento na Austrália, na sequência do atentado de 11 de Fevereiro.
"A Fretilin quer as eleições antecipadas talvez no Verão de 2009. O Governo diz que sim, diz que não, ainda não se pronunciou", disse Ramos-Horta, na entrevista conjunta à Lusa e RTP. Para o Presidente timorense, as eleições antecipadas "podem trazer vantagens para todas as partes".
"Se o Governo fizer um bom trabalho este ano de 2008, as eleições novas resultam numa vitória do Governo e a Fretilin perde", disse.
"Mas se o Governo faz um trabalho miserável, não consegue cumprir as promessas e fazer a execução orçamental, até eu prefiro ter eleições antecipadas porque não temos que os ter durante mais de três anos", sublinhou o chefe de Estado timorense.
"Portanto, o ano de 2008 é um grande teste para o Governo. Se fizer um bom trabalho, a Fretilin estará em desvantagem. Se fizer um trabalho medíocre, o povo quererá eleições antecipadas", acrescentou.
O chefe de Estado reconheceu que olha para si próprio, hoje, como o factor de união da sociedade timorense.
"Parece que sim. É o que revela a explosão popular em me acolher. É o que revela que os partidos todos tenham estado no aeroporto" hoje de manhã, frisou Ramos-Horta, eleito Presidente da República em 2007.
É com esse apoio que José Ramos-Horta diz "insistir no diálogo" político iniciado no regresso da visita oficial ao Brasil, em Janeiro deste ano, incluindo a reunião entre a aliança partidária no Governo e oposição, poucos dias antes dos ataques de 11 de Fevereiro, em que foi ferido a tiro com gravidade.
"Tivemos dois diálogos e correram de forma muito salutar e com propostas construtivas. O único ponto que (ficou) por discutir era a exigência de eleições antecipadas. Mas aí podemos chegar a uma solução de compromisso em que ninguém perde a face", afirmou José Ramos-Horta.
"Se houver eleições legislativas antecipadas, eu quero também eleições presidenciais antecipadas", declarou José Ramos-Horta, acrescentando que, nesse caso, não seria candidato, conforme a Constituição timorense.
"Não sou melhor que os outros. Os outros não são melhores que eu. Vamos testar com o povo", explicou ainda o Presidente da República.
"Disse também, na altura (Julho de 2006), que a minha preferência não era ser primeiro-ministro. Fui empurrado, sobretudo por Xanana Gusmão. E paguei um preço muito grande como primeiro-ministro porque assumi a responsabilidade numa situação muito difícil", considerou o actual chefe de Estado.
"Aceitei, tentei ser leal à Fretilin, respeitando a sensibilidade do partido nessa altura. Depois fui empurrado para eleições presidenciais e não me senti bem tendo como adversário o Francisco Guterres 'Lu Olo' (presidente da Fretilin)", referiu.
"Hoje, chego à conclusão que Fernando 'La Sama' (de Araújo, presidente do Parlamento), por exemplo, seria um bom Presidente, pela forma como agiu nestes dois meses", em que ocupou interinamente a chefia do Estado, acrescentou.
Sobre a estratégia em relação ao ex-tenente Gastão Salsinha, José Ramos-Horta assegurou que não irá seguir a mesma linha de diálogo que manteve com o major Alfredo Reinado.
"Não. Tiveram oportunidade durante ano e meio", explicou o Presidente da República sobre o grupo de Gastão Salsinha, que até 11 de Fevereiro liderava os chamados peticionários das Forças Armadas.
"Apresentei uma proposta há mais de um ano ao comando das Falintil-Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL). Na altura, a posição do comando era muito inflexível. Não queriam ouvir falar dos peticionários. Sentiam-se traídos", recordou José Ramos-Horta.
"No entanto, com muita paciência minha e humildade do comando das F-FDTL, ouviram-me, tiveram reuniões e aceitaram a minha proposta: todos os peticionários que quisessem voltar, podiam voltar através de um processo de novo recrutamento".
"Aos que não quisessem voltar, o governo dava um subsídio equivalente a três anos de vencimento para poderem retomar as suas vidas", lembrou o Presidente na entrevista.
"Primeiro, a organização não-governamental MUNJ disse-me que Salsinha e Reinado concordavam. Daí que eu decidi receber os dois em Maubisse. Mas quando cheguei lá, Reinado disse que não, que eles nunca disseram que concordavam com a proposta", contou José Ramos-Horta à Lusa e RTP.
"Isto é, não lidam com a questão com seriedade", acusou o Presidente.
"Entretanto, Salsinha deixou de ser uma pessoa sobre quem não pesa um mandado de captura. Envolveu-se directamente num ataque ao chefe de Estado e ao primeiro-ministro e tem que se apresentar à justiça", frisou o chefe de Estado timorense.
"Não foi necessário até hoje que algum timorense tivesse morrido. Já mais de metade dos elementos (fugitivos) se entregou com as suas armas. Só faltam talvez 12 pessoas com menos de 12 armas", acrescentou.
José Ramos-Horta repetiu, na entrevista, o caminho que apontou ao ex-tenente Salsinha à chegada a Díli: "Entregue-se".
SIC/Lusa, 17/04/2008
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